Igualdade no acesso à justiça
A igualdade perante a lei é premissa para a igualdade perante o Juiz. Esta segunda vem assegurada pela Constituição em seu art. 5o , inciso XXXV, configurando-o na garantia de acesso à Justiça. Todos devem ter as mesmas oportunidades na defesa de seus interesses, na medida em que todos são homens livres e iguais em direitos. Também denominada Princípio da isonomia, a igualdade perante a lei não se exaure na proibição de discriminações pela raça, sexo, condição pessoal e social, mas significa garantia de igual Tratamento normativo em todas as situações cujas características não exijam regra diferenciada; colocando, dessa forma, uma exigência de racionalização e de justificação das normas discriminatórias. Assim, a igualdade de todos perante a lei garante, a cada um, paridade no Tratamento sempre que iguais sejam as condições subjetivas e objetivas às quais a Norma jurídica se refere para sua aplicação. Consoante afirma Ferreira Filho, a igualdade constitui uma limitação ao legislador quando o proíbe de editar Regras que estabeleçam privilégios em razão da posição social, da raça, do Poder econômico. Por outro lado, pode ser entendida como regra de interpretação uma vez que o aplicador da lei não deve fixar discriminações nem privilégios ao interpretá-la. Mas a isonomia não se esgota na igualdade em sua dimensão estática, que pode ser resumida na expressão ‘todos são iguais perante a lei”. Esta é a igualdade meramente formal, a isonomia que decorre da lei e não da realidade. Trata-se, na verdade, de mera ficção jurídica, na medida em que é claro que os homens são desiguais, mas essa desigualdade é ignorada pelo legislador. Muitos são os fatores que colaboram para um Tratamento desigual das pessoas. O desnivelamento cultural, exteriorizado através da falta de recursos de toda sorte, faz com que muitos não tenham, sequer, conhecimento das normas jurídicas que possam regulamentar seus interesses. Muitas vezes até desconhecem quanto à existência de direitos que possam ser defendidos. Nesse sentido, Watanabe enumera dois fatores como responsáveis por um ordenamento jurídico desigualitário. A falta de orientação e de informação provocam, no indivíduo, obstáculos que o impossibilitam de chegar às vias jurisdicionais. Diante destas circunstâncias, muitos direitos não chegam às portas da Justiça por não serem, tampouco, reconhecidos pelos seus titulares, estando, assim, desprovidos de qualquer proteção jurisdicional. Visando a uma efetiva realização da igualdade, cabe ao Estado eliminar ou minorar tais diferenças, reduzindo, na medida do possível, a distância entre a ficção e a realidade, estando assim diante da denominada “igualdade em sua dimensão dinâmica’. Nesse contexto encontra-se o legislador, que, ao ditar normas diferentes para disciplinar situações desiguais, que entende sejam distintas, deve adequar a Disciplina normativa aos mutáveis aspectos da vida social. E, como bem acentua Watanabe, para se igualarem as condições dos desiguais, faz-se necessário maior orientação, bem como informação correta e precisa ao menos favorecidos, pois são esses os mais carentes devido à inferioridade de cultura ou de meios econômicos e, geralmente, os que mais ficam marginalizados no que se refere à Tutela de seus direitos, que ignoram. Ainda no plano da igualdade em sua dimensão dinâmica, como Instrumento para eliminar qualquer desigualdade, quer seja jurídica ou de fato, surge, no processo, o Princípio de equilíbrio de situações, não mais iguais, mas recíprocas, emergindo da moderna Concepção da relação jurídica processual. A esse equilíbrio de situações é que Faranda, Foschini, Grinover, Tarzia, dentre outros, denominam de paridade de armas ou par condicio. Analisando o Princípio da “paridade de armas” na Jurisprudência da Comissão Européia dos Direitos do Homem e na doutrina, Tarzia evidencia que tal Princípio é entendido como igualdade substancial e não formal, identificando-se mais com o contraditório do que com a igualdade formal. Assim sendo, o contraditório como contraposição dialética paritária exige eqüidistância moderada do Juiz com o objetivo de estimular a efetiva participação das partes no contraditório. Nesse contexto, o juiz, possuindo um papel mais “ativo”, “promocional” e “assistencial” no desenrolar do processo, leva, conseqüentemente, a uma decisão mais justa onde a colaboração e participação das partes deve ser equilibrada. O juiz, dispondo de amplos poderes, deverá manter paridade de armas entre as partes, preservando a dignidade e a autoridade da estrutura. A paridade de armas e a imparcialidade institucional do Juiz exigem que sua atuação seja Equânime. À medida que os litigantes não disponham de oportunidades iguais de maneira a nivelar as condições de desvantagens dos menos favorecidos frente ao Poder do mais forte, caracteriza Violação desse equilíbrio de situações. Por sua vez, ao juiz, utilizando seus amplos poderes a fim de impedir que haja desequilíbrio tanto no acesso das partes em juízo, como na atuação das mesmas no desenrolar do processo, cabe suprir tais falhas, porventura existentes, para que se atinja a efetiva paridade de armas, com Tratamento igualitário, resguardadas as mesmas condições de oportunidades na busca de Tutela jurisdicional garantida pelo justo Processo. Para tanto, o acesso a um justo Processo deve ser entendido, segundo Grinover, como o conjunto de garantias capazes de transformar o mero Procedimento em um processo, tal que viabilize, concreta e efetivamente, a Tutela jurisdicional. Dessa forma, a garantia do acesso de todos, indiscriminadamente, aos tribunais, deve ser interpretada, antes de tudo, como garantia a uma Justiça imparcial, na qual os litigantes se defrontem em igualdade de condições, ou seja, em “paridade de armas”, num Procedimento cooperatório, assistencial e até mesmo promocional, desenvolvido mediante efetivo e equilibrado contraditório. Para que ocorra esse equilíbrio de condições, Cappelletti, tratando da matéria, aponta que o Estado social moderno deve promover maior igualdade real ou menor igualdade formal, ao menos sob o ponto de vista de oportunidades, propiciando, com isso, suficiente informação e orientação ao litigante, pelo menos no que diz respeito aos seus próprios direitos, para que possam ser defendidos e reivindicados. Entende, o mesmo autor, que para essa igualdade de forças é necessário propiciar a todos o acesso à educação, ao trabalho, à saúde, fazendo com que todas as pessoas possam ter acesso aos meios de Comunicação modernos com o intuito de superar obstáculos representados, em grande parte, pela pobreza. Para atingir a esta finalidade, deve o Estado, através da Assistência judiciária aos necessitados, suprir tais deficiências ou, ao menos, minimizar a visível disparidade entre os litigantes. Nesse contexto, estudiosos ingleses afirmaram que mais importante que o conhecimento da acessibilidade aos tribunais, como requisito prévio para solucionar o problema da ignorância do direito, é a necessidade de dar, às pessoas, a Consciência dos meios disponíveis e como utilizar-se deles. Contudo, o Poder Público ainda está longe de conseguir uma Assistência judiciária eficiente e apta a abarcar todos os necessitados, persistindo, com isso, a Carência de muitos inviabilizados de chegar às portas dos tribunais, uma vez que ainda recebem Tratamento desigualitário, e permanecendo marginalizados, sem qualquer amparo jurisdicional, em razão de suas inferioridades, tanto culturais como financeiras. Ver: Acesso à Justiça.